A gentil amiga Lê, do blog Brinquedo de Mulher, teve a delicadeza de transcrever o poema inteiro (que eu não conhecia) do Eduardo Alves Costa.
Mesmo que já estejamos em contexto bem diferente daquele em que foi composto, vale a pena passear pelos versos e mensagem ainda muito atuais.
No caminho com Maiakóvski
Eduardo Alves Costa.
Na primeira noite eles se aproximam
e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem;
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa,
rouba-nos a luz, e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada.
Nos dias que correm
a ninguém é dado
repousar a cabeça
alheia ao terror.
Os humildes baixam a cerviz;
e nós, que não temos pacto algum
com os senhores do mundo,
por temor nos calamos.
No silêncio de meu quarto
a ousadia me afogueia as faces
e eu fantasio um levante;
mas amanhã,diante do juiz,
talvez meus lábios
calem a verdade
como um foco de germes
capaz de me destruir.
Olho ao redor e o que vejo
e acabo por repetir não mentiras.
Mal sabe a criança dizer mãe
e a propaganda lhe destrói a consciência.
A mim, quase me arrastam
pela gola do paletó
à porta do templo
e me pedem que aguarde
até que a Democracia
se digne a aparecer no balcão.
Mas eu sei,
porque não estou amedrontado
a ponto de cegar, que ela tem uma espada a lhe espetar as costelas
e o riso que nos mostra
é uma tênue cortina
lançada sobre os arsenais
Vamos ao campo
e não os vemos ao nosso lado,
no plantio.
Mas ao tempo da colheita
lá estão
e acabam por nos roubar
até o último grão de trigo.
Dizem-nos que de nós emana o poder
mas sempre o temos contra nós.
Dizem-nos que é preciso
defender nossos lares
mas se nos rebelamos contra a opressão
é sobre nós que marcham os soldados.
E por temor eu me calo,
por temor aceito a condição
de falso democrata
e rotulo meus gestos
com a palavra liberdade,
procurando, num sorriso,
esconder minha dor
diante de meus superiores.
Mas dentro de mim,
com a potência de um milhão de vozes,o coração grita
- MENTIRA!
10 comentários:
cara, um popema dramático, mas singelo e doído ao mesmo tempo expressando tb beleza e paz. e o blog da menina muito bom, assim como o seu dr evandro! parabéns, por isso é sempre bom voltar aqui! abração, leandro
isto é perfeito ... o contexto atual em parte pode ser diferente mas ainda é e sempre será atualíssimo ...
bjux
;-)
Evandro,Vc gosta de Fernando Pessoa? No Lua Imaginada, vou fazer uma semana em homenagem a ele... Passa lá para dar uma olhadela e saborear bela poesia... http://luaimaginadapoemas. blogspot.com
Abraços
Como lhe falei anteriormente , quando tive dúvida da autoria, este é um dos poemas que mais gosto. Para mim ele é como a música "como nossos pais" esta sempre atual.
Abraço
Evandro, sua cidade natal, mesmo sem ser o Rio, continua maravilhosa!
Obrigada pela visita!
Bjos
Obrigada pela referencia a meu blog e tbm pelo gentil Evandro,mas,
confesso que quando colei aqui, achei que vc pudesse achar ruim,afinal é um belíssimo,mas looongo poema!Talvez por isso muitas pessoas só conhecem aquele primeiro estrofe que vc havia postado anteriormente.
Bjs e uma boa semana.
Parabéns amigo Evandro pelos lindos post. Sempre coisa boa!
Deixo de tecer comentário sobre o poema, pois 'não tem preço'!
abraços
Concordo com o Ananias.
Como comentar o já dito?
Beijinhos
Para esclarecer definitivamente essa questão da autoria da autoria do trecho de poema: "Na primeira noite eles se aproximam ..."
Bem, o trecho é do poema de Maiakovski intitulado DESPERTAR É PRECISO. Eduardo Alves da Costa em seu poema NO CAMINHO COM MAIAKOVSKI, evoca o poeta russo e diz ao mesmo; "Tu sabes, conheces melhor do que eu a velha história." e menciona a citação de Maiakovski originalmente do poema DESPERTAR É PRECISO. O que gerou essa confusão é que o poeta niteroiense esqueceu que quando se cita frases, textos, sentenças proferidas por outra(s)pessoas(s) essas devem receber aspas.
Obrigado Anômimo pela boa contribuição. Assunto interessante esse, não?
Abraços
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